Há dias em que aprendemos mais do que queríamos, ou esperávamos aprender.
Há dias em que nos levantamos sem um motivo perceptível para o fazermos.
Há dias em que nos falha a bafagem.
Precisava de um pretexto para escrever. Não me apetecia usar os que tinha.
Peniche. O relógio marcava as 8:24 da manhã da última vez que olhei para ele antes de me sentar na areia a contemplar o mar.
Não sei se é só comigo ou se este fenómeno acontece com mais membros da comunidade surfista, mas preciso sempre de pelo menos uns 5 minutinhos a prezar o Deus Mar, a areia e, se existirem, as pessoas que me rodeiam.
Desta vez demorei mais tempo. Reparei, desde que meti o pé na areia, num senhor negro sentado em cima de um tronco.
Também eu sentada, encostei-me para trás e fechei por um instante os olhos de modo a ouvir melhor o toque das ondas e sentir com mais pujança o vento que teimava por marcar a sua figura.
Não demorou muito até notar que alguém se tinha arrumado ao meu lado.
Sem quase dar tempo para eu abrir os olhos comecei a ouvir uma voz robusta:
- Eu tive um amigo. Ter um amigo é raro! Chamava-se Elias.
Nasci em África e foi lá que cresci. Eu e o Elias estávamos sempre juntos e costumávamos correr à beira dos rios, pescar e construir abrigos onde passávamos noites a admirar os sons e o vento, tal como estavas a fazer agora – murmurava o mesmo senhor negro que olhara para mim quando cheguei –.
Um dia soube-se que tinha febre hemorrágica ebola, uma doença infecciosa grave, muito rara, frequentemente fatal, causada pelo vírus ebola.
E ao contrário do que se mostra nos filmes, é apenas moderadamente contagiosa. No entanto, como no lugar onde habitava os recursos não eram muitos, ele teria de ser isolado.
Eu sabia que muito provavelmente nunca mais o iria ver e no dia da despedida supliquei à minha mãe para o ir ver uma última vez. Ela bateu-me e vozeou comigo.

Mas eu fui na mesma e regressei a casa alagado em lágrimas.
Então, a minha mãe perguntou-me “Era para isto que querias ir? Valeu a pena?”.
E sabes, valeu mesmo a pena! Quando cheguei e vi-o entrar, sabendo que nunca mais o iria ver… ele olhou-me, sorriu e disse “Eu sabia que vinhas”.
Valeu por tudo. Valeu por todos os obrigados, por todas as lágrimas me estavam a cair, por todos os abraços. Valeu, de certeza, o teu surf.
Também eu lhe sorri e continuo a sorrir. Um sorriso pode ser uma vida.
Eu fiquei calada, ele ficou calado. Afinal não se trata apenas de liberdade, é também um pouco de lisura.
Não sei se a historia era verdadeira ou não, mas pouco me atinge.
Ganhei o dia, já tinha sobre o que escrever!
Agradeci-lhe.
Agarrei na prancha, sorri, e fui surfar.
vês já tens imensos seguidores.
ResponderEliminarPARABENS!!
ResponderEliminartocou me
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